Jovem precisa trabalhar

Apesar do título do blog, ainda estou longe da faixa sênior, tenho pouco mais de 40 anos, mas no mercado de trabalho já estou na batalha há pelo menos 25 anos, deixando de contar todas as minhas férias escolares desde os 8 que passava junto com meu pai, acompanhando-o durante o dia inteiro dentro do seu caminhão e aos sábados obrigado a estar sempre próximo enquanto ele trabalhava na construção doméstica.

Tanto tempo na labuta não me deixou rico, pelo contrário, mas tenho a certeza que estar no ambiente de trabalho desde muito cedo formou o meu caráter e construiu a pessoa que sou hoje. Mais do que dar valor às pequenas conquistas, aprendi desde muito cedo a ser dedicado, organizado e a conviver com todas as pessoas, de qualquer nível social e econômico, sabendo conversar, ouvir e me expressar.

Quando tirei meu título de eleitor, com 18 anos, informei que estava matriculado no primeiro ano da universidade, a funcionária do cartório não teve dúvida e emplacou meu nome na lista dos convocados a trabalhar nas eleições. Nessa época já carregava 4 anos de experiência no BCN, os primeiros meses como mensageiro e o tempo seguinte como auxiliar administrativo, então, já era um jovem mais do que treinado nas rotinas do escritório, com muita habilidade para digitação no telex e operação de calculadoras, o máximo de tecnologia existente na época, fora todo o conhecimento de arquivo, conferência de listagens, lançamentos contábeis e tudo mais.

Sem treinamento algum, trabalhei como mesário na época das urnas de papel e jamais tive qualquer problema de votação nas seções que participei, e foram muitas, passando por várias funções e chegando a presidir a seção por duas eleições seguidas. Quando mudei de cidade, pedi liberação das convocações porque já considerava a minha missão  mais do que cumprida como cidadão.

Esse ano pedi para voltar e fui encaminhado para ser Coordenador da votação numa escola, com a função principal de orientar e garantir o bom andamento das eleições, sendo o representante do Juiz Eleitoral no local de votação. Me surpreendi ao ver que a grande maioria dos jovens convocados como mesários apresentaram um desânimo assustador em assumir suas atividades, com atrasos no comparecimento, falta de comprometimento e um desconcertante despreparo para executar tarefas simples como procurar nomes em ordem alfabética e operar com tranquilidade uma urna eletrônica que, convenhamos, foi feita para funcionar em qualquer condição com uma grande simplicidade de operação.

São jovens inexperientes e despreparados, a maioria ainda com total dependência dos pais, estudantes medianos e muito distantes do mercado formal de trabalho. Alguns até devem saber falar algum idioma, mas duvido que consigam se expressar razoavelmente em bom português, pois não conseguem organizar uma simples lista em ordem alfabética. Receberam instruções, mas são incapazes de aplicá-las, agem por instinto e sequer se dão ao trabalho de ler um manual, portanto duvido também que consigam ler um texto maior que o que costumam ver no Twitter. Cálculos devem ser ainda mais lentos, penso que são incapazes de fazer uma continha mental, dependentes de uma calculadora. A interação pessoal então fica devendo ainda mais, o tempo inteiro jamais ouvi deles um “por favor”, “com licença” ou “obrigado”, palavrinhas mágicas que devem ter ficado esquecidas na educação infantil, ao contrário disso, emitem alguns grunhidos que mais afastam do que conquistam.

Estão todos ficando por muito tempo protegidos sob as asas dos pais zelosos e não estão aprendendo mais as coisas que a minha geração era obrigada a aprender desde muito cedo, pois não tínhamos celulares para pedir socorro quando nos víamos pressionados, tínhamos que nos virar e nos defender sozinhos.

O trabalho que me formou foi negado aos jovens de hoje, seja por princípios de valorização de infância seja por uma falência do sistema produtivo. Antes os jovens pobres com poucas perspectivas de formação cultural e intelectual podiam ser contratados por uma grande empresa e alcançar cargos respeitáveis, não são poucos os exemplos de grandes líderes empresariais que foram office boys. Hoje os jovens dessa classe média baixa estão praticamente excluídos, restando após uma formação educacional medíocre, os cargos mais desvalorizados dentro das organizações, com expectativas de promoção praticamente nulas. As grandes empresas valorizam atualmente os jovens trainees com formação privilegiada das melhores escolas particulares e amplo domínio de idiomas estrangeiros, com vivência internacional.

Assim, o “sonho americano” permitido aos jovens carentes deixou de existir. Estabeleu-se na prática um sistema de castas, onde os bem nascidos têm o caminho suavizado e garantido pela herança dos pais bem sucedidos. Para os outros, o resto. No meio desse resto, da falta de esperança, onde não é difícil optar por soluções que parecem mais fáceis, com ganhos mais imediatos e que dificilmente têm volta, como as drogas.

Por isso acredito na urgência de uma revisão da condição dos jovens no mercado de trabalho, acabando com o estágio ou programas como “jovem aprendiz”, dando-lhes responsabilidades e oportunidades reais de aprender a enfrentar o trabalho desde cedo, com cobranças e competições, mas também com possibilidades verdadeiras.

Um comentário:

ADRIANA disse...

ADOREI... e concordo com tudo que esta escrito, foi assim mesmo...
Confesso que também fiquei impressionada com o descomprometimento da maioria desses jovens...
É assustador pensar que eles irão cuidar do nosso país daqui alguns anos!
Precisamos mudar muita coisa...Urgentemente.